Crítica: Revelação (2020)

Quando vi o surpreendente documentário Prodigal Sons (2010), sobre os conflitos familiares entre dois irmãos, fiquei confuso porque a protagonista era uma mulher trans lésbica. Até então, eu nunca tinha visto uma representação assim em qualquer mídia. O filme me fez entender melhor a diferenciação entre identidade de gênero e orientação sexual, além de ter mostrado como pessoas trans são muito mais complexas do que filmes e séries costumavam retratar.

Acabei pensando em Prodigal Sons quando conferi outro documentário que é um exemplo do poder transformador da arte: Revelação (Disclosure, 2020). Lançado pela Netflix , o filme utiliza uma estrutura convencional para deixar bem claro o que era óbvio para pessoas trans: a forma prejudicial com que o cinema e a TV sempre as retrataram. A partir de depoimentos e análises aprofundadas, percebemos como cenas e decisões fílmicas aparentemente triviais reforçam preconceitos, incluindo filmes clássicos em que pessoas trans são mostradas erroneamente como ameaças ou figuras descartáveis. Outro ponto de discussão importantíssimo é a escolha de atores cis para personagens trans, o que reduz oportunidades de uma minoria e leva o público a enxergar mulheres trans como homens disfarçados, por exemplo.

Na última década, temos visto mais e mais representatividade dentro e fora das telas. Séries como Pose e Orange Is The New Black ou filmes como Uma Mulher Fantástica (A Fantastic Woman, 2017) não são feitos para ensinar ninguém sobre a experiência trans. Porém, ao serem extremamente bem-sucedidos no que propõem, involuntariamente acabam ajudando a quebrar paradigmas e gerar mais empatia por quem é representado negativamente há décadas.

Revelação é um documentário essencial para qualquer pessoa e seu impacto com certeza contribuirá para que o público reavalie suas concepções e comece a notar como a arte acaba influenciando nossas percepções a partir de repetições de padrões. Qualquer pessoa que faça parte de uma minoria sabe muito bem que ver alguém com as mesmas características retratado de forma complexa e sob um olhar empático dá esperança de que mais pessoas te enxergarão como você realmente é.

Como temos acompanhado, a luta ainda está longe de ser vencida, afinal, ainda há muitas pessoas desinformadas ou simplesmente má intencionadas por aí, como a transfóbica JK Rowling, que utiliza sua plataforma para espalhar informações erradas. Não é num passe de mágica que a sociedade se transforma, mas filmes como Revelação são um grande passo para um futuro em que o cinema tenha mais representatividade e, consequentemente, uma quantidade maior de pessoas deixe de aceitar representações retrógradas.

Nota: 8

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